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Coluna do PVC

Dunga não foi preconceituoso e respondeu à pergunta. É justo dar o contexto

PVC

27/06/2015 01h14

A pergunta foi clara e Dunga respondeu a ela. Referia-se à afirmação de Taffarel, dois dias atrás, de sua geração, a de Mauro Silva e de Dunga, terem sofrido com frases semelhantes às atuais. Hoje dizem que a geração é a pior das últimas décadas, que se trata de uma seleção de desconhecidos. Sem carisma. Taffarel deixou claro que aconteceu o mesmo 25 anos atrás. Romário, não, mas Mazinho, Aldair, Dunga, Márcio Santos, Mauro Silva, sofreram com o rótulo de não haver mais jogadores como nas gerações anteriores. Não havia mais Zico, Júnior, Sócrates, Falcão.

Taffarel relatou o que sofreu nas Copas Américas de 1989 e 1991, a que ganhou e a outra em que foi vice-campeão. E tem razão. A questão a Dunga era sobre qual pressão era maior, a de hoje ou a que sua equipe viveu no seu passado de jogador. Dunga respondeu.

Deixou claro que a única maneira de superar esta pressão é vencer, como a sua geração venceu. Esta frase não foi dita, assim. Mas está clara, para quem quiser ouvir o que ele disse.

Mas no meio da resposta houve uma frase, uma única frase, que retirada de contexto dá problema. Ele diz que apanhou como afro-descendente.

Se dissesse que apanhou tanto que se sentiu como escravo no século XIX estaria mais justo. Não por ter apanhado, mas por manifestar sua sensação de uma maneira isenta de qualquer preconceito.

Mas nem todas as vezes todo mundo usa as palavras da maneira mais justa. Nem todas as pessoas aprenderam a usá-las da maneira certa — mesmo as treinadas para usá-las corretamente.

Dunga fez uma salada de letras e construiu uma metáfora péssima. Horrível! Não quer dizer que tenha sido preconceituoso. Não foi.

O xis da questão é saber como a geração atual, apontada como fraca, a pior das últimas décadas, vai reagir às críticas. É possível que não vença a Copa América e terá de conviver com o fracasso.

A de Dunga, também. Em 1987, o Brasil caiu na fase de grupos da Copa América perdendo de 4 x 0 para o Chile. Dunga e Romário faziam parte do grupo. Semanas depois, a revista francesa France Football publicou a capa, com a foto de Josimar: "Qual é o seu futuro, Brasil?" Sete anos depois, apesar do fracasso em 1990  e na Copa América de 1991, a seleção foi campeã do mundo.

Dunga respondeu sobre isso e sobre as pancadas que sua geração recebeu. Este contexto é mais importante do que o tropeço que ele sofreu com as palavras, para as quais nunca foi treinado. Mesmo que tenha tropeçado terrivelmente na frase que construiu.

Sobre o Autor

Paulo Vinicius Coelho é jornalista esportivo, blogueiro do UOL, colunista da Folha de S. Paulo. Cobriu seis Copas do Mundo (1994, 1998, 2006, 2010, 2014 e 2018) e oito finais de Champions League, in loco. Nasceu em São Paulo, vive no Rio de Janeiro e seu objetivo é olhar para o mundo. Falar de futebol de todos os ângulos: tático, técnico, físico, econômico e político, em qualquer canto do planeta. Especializado em futebol do mundo.

Sobre o Blog

O blog tem por objetivo analisar o futebol brasileiro e internacional em todos os seus aspectos (técnico, tático, político e econômico), sempre na tentativa de oferecer uma visão moderna e notícias em primeira mão.