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Coluna do PVC

O São Paulo e sua reforma pela metade

PVC

07/02/2019 14h31

André Jardine será o técnico do São Paulo contra o Talleres, na próxima quarta-feira, no Morumbi, pela Libertadores. Ser o treinador no dia seguinte a uma hipotética eliminação é quase impossível.

Em parte, porque a torcida espera uma decisão drática. Em parte, porque o avião que chegou a Córdoba com 25 conselheiros que apoiavam o time e o presidente Leco, voltou de lá com o olhar atravessado e crítica ferozes a todas as decisões adotadas até terça-feira.

Se mudar de treinador fosse o remédio para fazer o São Paulo voltar a ser um time modelo, o Morumbi teria recheado sua galeria de troféus 15 vezes nos últimos dez anos. Foi esse o exato número de mudanças de comandantes da equipe desde a queda de Muricy Ramalho, em 2009.

Demitir Jardine após ser eliminado da Libertadores é o cardápio do futebol brasileiro, não exclusivamente de Leco ou de Raí. É a prática estabelecida em todos os grandes clubes. O agravante é que o São Paulo, e Raí em particular, conheceram de perto os efeitos da manutenção de ideias em vez do pescoço do treinador exibido em praça pública.

Sempre vale voltar a março de 1992, quando o noticiário cravava que Telê Santana não resistiria a mais uma derrota e seria demitido irremediavelmente. Foram cinco revezes sucessivos, todos acompanhados da informação equivocada de que Telê cairia. Perdeu para o Flamengo por 3 x 2, para o Guarani por 1 x 0, para o Criciúma por 3 x 0, Palmeiras por 4 x 0 e Internacional por 1 x 0. Três meses depois, foi campeão da Libertadores. Em dezembro, do mundo, com o maior gol de Raí.

O São Paulo era diferente. Seus vícios também eram distintos. Sua diretoria tinha seis homens no departamento de futebol, todos políticos de conselho deliberativo. A coalizão existia por causa de um cardeal chamado Antônio Leme Nunes Galvão. Depois de liderar a chapa que derrotou Juvenal Juvêncio nas eleições de 1990, preferiu não governar, indicou José Eduardo Mesquita Pimenta para o posto, mas manteve sua liderança nos bastidores.

A política de condomínio que contamina clubes brasileiros, de norte a sul, não entrava no vestiário. Hoje tudo é diferente. Em todos os clubes, o Conselho Deliberativo tem o comprometimento de uma prostituta num bordel.

Muita gente dirá, com razão, que a escolha de André Jardine não era correta para este momento, véspera da Libertadores. A decisão foi de Raí. Se o erro foi dele, então fora Raí?

Não! Fora a mesmice. Fora as decisões iguais que levaram a resultados idênticos e derrotas seguidas nos últimos dez anos. Eliminações para Colón, Defensa y Justicia, Juventude, Avaí, Bragantino, Coritiba, Ponte Preta…

Neste momento, não há ideia de mexer no comando do departamento de futebol. Nem deve haver. Mas Raí estava visivelmente inseguro na entrevista coletiva depois da derrota, em Córdoba. Ou se tem convicção, ou não há reforma. Por enquanto, a mudança são-paulina se parece com uma limpeza na sala de jantar, com o flagrante da louça empilhada na pia assim que os convidados entrarem na cozinha.

Não pode haver um time moderno e de troca de passes com Jucilei fora de forma e Nenê fazendo a transição como ponta direita. Aqui se somam erros de escalação de André Jardine a equívocos da formação do elenco de Raí.

A reforma inteira exige jogadores velozes, de bom passe e formação de uma equipe capaz de fazer o São Paulo forte pelos próximos anos, não pelas próximas semanas. A pergunta atual não é se o São Paulo vai se classificar na Libertadores, até porque a resposta provável é não. A questão é como o São Paulo pretende fazer para voltar a ser vencedor por um longo período.

Isso não se faz nem com agrados políticos nem com decisões demagógicas. Faz-se com convicção.

Sobre o Autor

Paulo Vinicius Coelho é jornalista esportivo, blogueiro do UOL, colunista da Folha de S. Paulo. Cobriu seis Copas do Mundo (1994, 1998, 2006, 2010, 2014 e 2018) e oito finais de Champions League, in loco. Nasceu em São Paulo, vive no Rio de Janeiro e seu objetivo é olhar para o mundo. Falar de futebol de todos os ângulos: tático, técnico, físico, econômico e político, em qualquer canto do planeta. Especializado em futebol do mundo.

Sobre o Blog

O blog tem por objetivo analisar o futebol brasileiro e internacional em todos os seus aspectos (técnico, tático, político e econômico), sempre na tentativa de oferecer uma visão moderna e notícias em primeira mão.