A seleção ainda é nossa paixão secreta?
O teto do túnel acústico caiu e atingiu um ônibus na ligação entre a zona sul e oeste do Rio de Janeiro, o presidente Jair Bolsonaro apoiou um texto absurdo sobre o desgoverno do país que governa, José Dirceu se entregou à Polícia Federal e disse que o vulcão está em erupção, o dólar bateu R$ 4,10. E, no entanto, todos nós xingamos a seleção brasileira nesta sexta-feira (17).
Repetimos exaustivamente: ninguém mais liga para a seleção.
Mas não se falou tanto sobre o dólar ou sobre o túnel que bloqueou o Rio de Janeiro, quanto da seleção brasileira.
Nossa eterna paixão secreta. Tão secreta que nem sabemos que ainda somos apaixonados por ela.
Ódio e amor são sentimentos tão próximos. Se não fossem, quem ligaria para o Tite na sexta?
Mas reclamamos sobre por que Tite não chamou Vinicius Junior ou Lucas Moura, por que não tirou Neymar da lista ou anunciou a retirada da braçadeira de capitão, por que raios há tantos veteranos, mesmo que tenham sido chamados sete jogadores abaixo de 23 anos e seis acima dos 30.
Plágio do sociólogo Ronaldo Helal, que diz que os brasileiros amam odiar os argentinos, que odeiam nos amar, parece mentira, mas é verdade que amamos odiar a seleção e odiamos admitir que a amamos.
Sempre foi assim. Costumamos afirmar que "hoje em dia" preferimos os clubes. Em 1958, na despedida da seleção brasileira para disputar a Copa, uma parte da torcida gritou Corinthians, adversário do time nacional.
Em 1970, Zagallo estreou na seleção com a coluna de Aroldo Chiorino, na Folha, reclamando da convocação de Leônidas, veterano zagueiro do Botafogo. Zagallo respondia que Nilton Santos foi campeão aos 37 anos. Felizmente, Leônidas não chegou até a Copa. Piazza jogou improvisado de zagueiro.
Sábio foi Telê Santana que, em 1982, não fez entrevista coletiva para convocar o Brasil. Chamou aos poucos, à medida em que seus clubes eram eliminados do Campeonato Brasileiro. Foi criticado até por, pela primeira vez, convocar dois jogadores que atuavam no exterior: Falcão e Dirceu.
Dois dias antes da estreia do Brasil na Espanha, em 1982, João Saldanha escreveu na Folha uma coluna sob o título "O Fantasma da estupidez." Afirmava ser preciso diminuir a intensidade dos treinos. "Parem de arrebentar nossos jogadores e montem este time de uma vez."
Neymar vai jogar a Copa América. Claro que vai. Difícil achar um exemplo em seleção de qualquer país de algum técnico que não convocasse seu maior craque por livre e espontânea vontade.
Está claro que Tite terá de impor disciplina a seu melhor jogador, o que ainda não conseguiu mostrar. É sua obrigação.
Que a seleção terá de mudar jogadores da defesa, depois da competição sul-americana.
A média de idade agora é de 27 anos. Na Copa do Mundo foi de 28,2. A França foi campeã com cinco acima dos 30 e oito abaixo dos 23. Sua média, a mais baixa da Copa, era de 26.
O grande problema passa pela discussão sobre a geração, levantada por Luis Figo, aqui no UOL.
De fato, quando se olha para o banco de reservas, a situação é parecida com a de 2018. Faltam mais reservas diferentes, com drible e fantasia. Poderia ser Vinicius Junior ou poderia haver Pedro no lugar de Gabriel Jesus.
Um centroavante diferente de Richarlison, que será ponta, e de Firmino. Chance para mudar a característica do jogo.
Neste caso, importa pouco que Pedro e Vinicius Junior tenham sido convocados e não tenham sido testados, por suas lesões levarem aos cortes.
Seriam alternativas, para transformar jogos difíceis.
Ainda dá tempo.
Mesmo assim, é preciso olhar para dentro de nós e entender a ira depois da convocação. Se ninguém liga mais para a seleção, e se não faltou outro assunto na sexta-feira, queria mesmo estar indignado quando o governo diz que o país é impossível de governar.
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