Os treinos fechados e o custo benefício
O Palmeiras treinava muitas vezes no velho estádio municipal de Barueri, no final de 1997. Naquela época, este colunista cobria treinos do time de Felipão. Sexta-feira de folga, fim de tarde, escuto o Globo Esportivo. O repórter José Calil pergunta a Felipão se é verdade que o treino seria fechado no dia seguinte por causa de um jornal que desenhava o posicionamento tático de sua equipe. Felipão confirmou.
Cheguei a Barueri cedo. O assessor de imprensa, Acaz Fellegger, me abordou. Respondi: "Acaz, se o Felipão tivesse pedido para não desenhar ou para diminuir a quantidade, eu certamente teria atendido. Mas ele diz que vai fazer treino secreto por causa dos meus desenhos. Minha pauta hoje é essa." Como o campo de treino ficava ao lado de um morro, subi e assisti ao treinamento. Na descida, Felipão estava bravo. Claro que estava: "Se o Palmeiras ganha, vocês vão para Tóquio. Se perde, vocês vão para Araçatuba!"
Difícil explicar nessas horas que jornalista não deve torcer a favor ou contra. Deve trabalhar. Mesmo que muitas vezes grite gol, o objetivo é impedir que gostos pessoais interfiram em análises que devem ser isentas. Muita gente não entende esse limite. O técnico escolhe a maneira como executar seu trabalho. Se o repórter apura o que está acontecendo, mérito dele.
Toda esta introdução se dá em função de três repórteres terem assistido ao treino fechado da seleção brasileira, na sexta-feira à tarde, em Teresópolis.
Tudo tem bônus e ônus.
A assessoria de imprensa da seleção brasileira informou que o treino seria fechado. Foi gentil. Na portaria do condomínio onde fica a Granja Comary, havia uma placa com a frase: "Treino fechado. Agradecemos a compreensão." O texto não era só para a imprensa, mas também para a população, que costuma se aproximar da área. Dias atrás, o treino do Chile também foi assistido por um jornalista, apesar do pedido para que houvesse privacidade. Quem esperou Reinaldo Rueda bravo surpreendeu-se: "É o trabalho do repórter", respondeu.
É claro que há o outro lado. Numa relação pessoal, se alguém faz um pedido e não é atendido, natural não atender da próxima vez. Reciprocidade não significa punição. Mas se o mesmo repórter que furou o treino secreto pedir para agendar uma entrevista exclusiva, o natural é que a resposta seja negativa.
No caso da Granja Comary, durante todo o período da Copa do Mundo de 2014, dizia-se ser impossível fazer treinos fechados. Tite mostrou que é possível fazê-los, desde que contando com a compreensão solicitada na placa em frente à Granja. Se entrar no condomínio ou subir o morro, dá para ver. O trabalho a portas cerradas muitas vezes não é para esconder segredos. É pela privacidade de um grito, uma bronca ou um posicionamento.
Em 2014, houve elogios à abertura dos jogadores da Alemanha, concentrados na Bahia, e ao sistema de treinos, que ninguém viu. Todos tinham aberturas de quinze a vinte minutos, no máximo. Em 2018, colegas europeus julgavam Tite arrogante por divulgar a escalação antecipadamente. Ele diminuiu a quantidade de vezes em que faz isso. Não é por divulgar ou não divulgar que vai ganhar ou perder. Mas é seu direito dizer quem vai jogar ou não dizer, abrir o treino ou fechar. O direito do repórter é tentar assistir. E depois entender se a relação estremecer. Custo, benefício.
A relação entre imprensa e personalidades não deve ser "nós contra eles." São relações profissionais, mas não deixa de ser pessoal, porque o tratamento se dá entre pessoas, com o perdão da redundância.
Em 1997, não desenhei nenhum segredo de Felipão. Ele ficou bem bravo por um tempo.
A informação secreta de 2019 é que Alex Sandro será titular e Filipe Luís ficará no banco de reservas.
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