Influência estrangeira foi decisiva antes de Brasil campeão mundial
A final do primeiro turno entre o Flamengo, de Jorge Jesus, e o Santos, de Jorge Sampaoli, reforça a ideia de que o intercâmbio de treinadores aumentou o repertório e interferiu na melhoria do nível técnico. A média de gols deste ano é 6% maior do que em 2018. O Flamengo tem o melhor ataque da história dos pontos corridos com 20 clubes, no primeiro turno, e o Santos tem o segundo maior número de gols marcados. Os treinadores estrangeiros não são o único fator, mas o intercâmbio sempre fez bem ao futebol do Brasil.
Voltar no tempo ajuda a entender isto.
Dos quatro primeiros campeões do Rio-São Paulo, três eram dirigidos por treinadores internacionais. O Palestra Itália ganhou em 1933 sob o comando do uruguaio Humberto Cabelli. Também o Palmeiras, em 1951, foi dirigido pelo uruguaio Ventura Cambom e o argentino Jim López orientava a Portuguesa de 1952. Naquela década, o São Paulo foi campeão paulista sob o comando do húngaro Béla Guttmann, que influenciou diretamente a Vicente Feola, treinador da seleção no Mundial de 1958, na Suécia.
Béla Guttmann trocou o São Paulo pelo Porto, foi campeão português em 1959, e seguiu para o Benfica, onde ganhou a Copa dos Campeões da Europa em 1961 e 1962. A influência estrangeira em Portugal também se deu com brasileiros, como Oto Glória, antecessor de Guttmann no Benfica.
A mistura de culturas faz bem. Na década de 1960, o Palmeiras ganhou o Rio-São Paulo sob o comando do argentino Filpo Nuñez, que já havia trabalhado em clubes brasileiros como o Vasco, o Cruzeiro e o Corinthians. Filpo era quase brasileiro, mas nascido no futebol argentino.
Muitos desses estrangeiros conheciam a cultura brasileira. Casos de José Poy, vice-campeão brasileiro pelo São Paulo, em 1971, goleiro são-paulino nas décadas de 1940 e 1950. Muitos dos que chegaram depois sofreram pelas particularidades, ou vícios do país. Muito antes de começar o discurso de que os treinadores brasileiros estavam ultrapassados, houve intercâmbio com treinadores do exterior. Toda vez que se generaliza, cometem-se erros. Os treinadores brasileiros não estão ultrapassados, mas há os que têm trabalhado melhor e outros pior.
É assim, também, no exterior. O inglês Roy Hodgson dirigiu a Suíça na Copa do Mundo de 1994, foi eliminado com a Inglaterra na fase de grupos da Copa do Mundo do Brasil, em 2014, e nas oitavas-de-final da Euro 2016, pela Islândia. Hoje, aos 72 anos, dirige o Crystal Palace, em quarto lugar na Premier League. Desde 1992, não há um único treinador nascido na Inglaterra campeão inglês. Hodgson está lá e convive com Guardiola e Klopp.
Na era dos pontos corridos, depois de 2003, o São Paulo teve quatro técnicos estrangeiros: Roberto Rojas, Juan Carlos Osorio, Edgardo Bauza e Diego Aguirre. O Internacional foi dirigido por Jorge Fossatti e Diego Aguirre, o Athletico Paranaense por Lothar Matthäus e Miguel Angel Portugal, o Corinthians por Daniel Passarella, o Palmeiras por Ricardo Gareca, o Cruzeiro por Paulo Bento, o Grêmio por Darío Pereyra e Hugo De León, A diferença é o bom nível do treinador e do projeto que assume. Jorge Sampaoli e Jorge Jesus são ótimos profissionais e caíram em lugares que dão respaldo.
A lembrança de que, no Brasil, só houve um campeão nacional treinado por estrangeiro, e mesmo assim em um único jogo, dá a ideia de que nunca houve intercâmbio. É um equívoco. Carlos Volante assumiu o lugar de Geninho, ex-Botafogo, apenas no último jogo da Taça Brasil de 1959. Mas o Rio-São Paulo e os estaduais estão repletos de histórias de treinadores estrangeiros, como Jorge Jesus e Sampaoli. Em 1953, o São Paulo foi campeão estadual dirigido pelo argentino Jim López e o Flamengo ganhou o carioca sob o comando do paraguaio Fleitas Solich, observado com resistência pelos discípulos de Flávio Costa, especialmente depois de levar 6 x 0 em seu terceiro compromisso, na Gávea.
Em pouco tempo, Solich foi apelidado de "Bruxo." Nem era bruxaria. Era apenas trabalho.
Como os de Jorge Jesus e Jorge Sampaoli, que duelarão pelo título simbólico do primeiro turno, no próximo sábado, no Maracanã.
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