Violência volta a nível intolerável e com um ingrediente extra: o tiroteio
O fim de semana no Rio de Janeiro foi assustador, pelas brigas nas arquibancadas e nos arredores de São Januário e do Engenhão. A cidade armada leva para as cercanias dos estádios o tiroteio. Não é inédito do Rio. Em Minas Gerais, em Pernambuco, em Goiânia. Há duas semanas, o clássico Goiás x Vila Nova também registrou tiros e pancadaria na arquibancada.
Há tempos, repetimos que a violência estava mais fora do que centro do estádio. Isto não é mais verdade. Voltou com força, com episódios como a pancadaria entre a torcida do Corinthians e a Polícia Militar do Rio de Janeiro, no Maracanã, ano passado. Não se tem visto brigas dentro do Morumbi, Allianz Parque, Pacaembu, Vila Belmiro, Mineirão, Independência e Arena Corinthians, mas há episódios no Mané Garrincha, Maracanã, Engenhão, Serra Dourada, São Januário.
É óbvio que a violência da cidade contribui. Mas não pode ser desculpa para que não solucionar o problema. O aplicativo Fogo Cruzado contabiliza 15 titoreios por dia na região metropolitana do Rio de Janeiro. Se a cidade inteira está armada, natural que alguém puxe o gatilho na frente de um estádio. Se quem paga imposto não tem direito a policiamento, nem escola, nem hospital, a conseqüência é que não possa sair de casa para trabalhar nem para ir ao estádio.
Mas ainda se vai ao cinema, ao teatro. Logo, é preciso lembrar de que o pagamento de impostos permite exigir que se tenha o direito de ir e vir, a São Januário, ao Engenhão, ao Maracanã, ao Morumbi, ao Allianz Parque, a Itaquera…
O futebol permitiu se tratado como vilão por trinta anos e é vítima. Daí a CBF precisar se manifestar e cobrar segurança do Estado. Também dos responsáveis pelos clubes.
O episódio de São Januário, no sábado, tem ingredientes ímpares. Levar o jogo para sua casa é direito do Vasco. Mas a falta de hábito de jogar contra o Flamengo na Colina e a cultura do ódio ao Flamengo mais do que o amor ao Vasco — frase bem construída por Álvaro Oliveira Filho na Rádio Globo — faz o vascaíno não admitir levar desaforo em seu estádio. Não entender que em São Januário ganha-se e perde-se, como no Maracanã.
Durante anos, Eurico Miranda fez a campanha de antagonismo ao Flamengo, para o Vasco se tornar, como se tornou, o grande rival rubro-negro. Em outras épocas foi o Botafogo, nos anos 1960, ou o Fluminense. O Vasco virou o adversário. Pior do que isto, o inimigo. O direito de jogar em São Januário no futuro precisa vir acompanhado de uma campanha civilizatória. No início dos clássicos do Santos na Vila Belmiro também houve brigas feias. Em 1991, parte da imprensa passou a madrugada na Santa Casa acompanhando os feridos depois de um Santos x Palmeiras. Mudou. O santista, o palmeirense, o corintiano e o são-paulino se acostumaram aos jogos na Vila.
Pode ser assim também em São Januário, embora prefira-se o Maracanã para os clássicos — outra dívida do governo do Estado do Rio.
O que não se pode acompanhar é com a briga de volta à arquibancada.
A morte não causa mais espanto.
Precisa causar.
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