O custo-benefício do torcedor brasileiro
As arquibancadas lotadas de Itaquera para Corinthians 1 x 1 São Paulo, sábado à tarde, elevaram o 13o colocado a um grupo seleto. Flamengo, São Paulo, Palmeiras e Corinthians têm média de público superior a 30 mil torcedores no Campeonato Brasileiro.
Desde 1983, não havia quatro clubes com índice tão elevado no torneio mais importante do país. O Brasileirão de 35 anos atrás foi o de maior número de espectadores da história: 22 mil/partida. Flamengo, Santos, Vasco e Atlético Mineiro levavam mais de 30 mil. Era a última temporada com quatro times nesse patamar. O Corinthians, eliminado sem perder em casa, arrebanhava 28 mil para ver Sócrates e Casagrande.
O Brasileirão 2018 é surpreendente. Criticado em seu nível técnico, tem a de maior presença de torcedores nos estádios de quatro times nestas últimas 35 temporadas. Atualmente, 18.500 por jogo. A média geral perde para 1983 e 1987.
O ticket médio cobrado pelo Flamengo é de R$ 30. Os valores variam para o São Paulo (R$ 36), Palmeiras (R$ 57) e Corinthians (R$ 43). Entre os doze clubes mais tradicionais do país, o bilhete mais barato é o do Botafogo. A média é de R$ 16. É também o clube grande de menor bilheteria.
O grande contraste se deu neste final de semana.
O Botafogo fez promoção do preço do ingresso para lotar o estádio Nílton Santos no clássico contra o Flamengo. A meia entrada podia ser comprada por R$ 2,50, valor menor do que o do transporte coletivo de Copacabana ao Engenho de Dentro. Dividido o valor total arrecadado de R$ 169.885 pelo público de 16.882, o valor médio do ticket foi de R$ 10. Havia 19 mil torcedores no estádio e menos de 17 mil pagaram para assistir à vitória do Botafogo por 2 x 1. Ano passado, Botafogo x Colo-Colo, havia 38 mil pessoas no Nílton Santos com ticket médio de R$ 55.
Quem disser que a torcida ia ano passado, e não vai neste ano, porque o espetáculo era melhor ganha uma camisa de seu clube de coração.
No domingo à noite, o Fluminense fez promoção e cobrou R$ 10 pelo bilhete mais barato. Havia apenas 11 mil tricolores no Maracanã para o empate 0 x 0 contra o Sport. Verdade que a torcida carregava a frustração da derrota para o Atlético Paranaense e não havia perspectiva de boa atuação.
Em Itaquera, o Corinthians em crise levou 43 mil alvinegros para o empate por 1 x 1 contra o São Paulo. Em média, o bilhete custava R$ 44. A diferença não está no horário da partida. Ou não haveria 41 mil torcedores para ver o Corinthians contra o Flamengo numa sexta-feira à noite, antevéspera do primeiro turno da eleição presidencial.
Há muitas razões para o público não ir ao estádio, todas exaustivamente detalhadas nas páginas de jornais e programas de rádio e TV nos últimos quarenta anos. Há também vários outros motivos para o torcedor ir. Surpreendente é ouvir discussões sobre por que não há público no atual Brasileirão, olhando exemplos de Fluminense, Botafogo e Paraná Clube. Este é o campeonato com mais gente nas arquibancadas nos últimos 35 anos. Veja, não são 35 semanas.
Impressionante também não haver nenhum movimento para descrever por que o público vai. Há duas hipóteses do que está levando mais torcida. A primeira é histórica. Quando times de grande apelo popular disputam a taça, a população reage positivamente. Isto explica o fenômeno do Flamengo, de volta ao Maracanã, com 47 mil pessoas por partida, seu melhor índice no Brasileiro desde 1987. Em parte, o velho fator explica também o sucesso do São Paulo, campeão do primeiro turno.
A segunda hipótese é mais recente. Os planos de fidelização de Corinthians e Palmeiras fazem seus fiéis e avantis irem aos jogos inexpressivos por saberem que a única forma de terem acesso aos jogos decisivos por preço acessível. O palmeirense só assistirá ao jogo do título brasileiro pagando menos de R$ 30 se tiver assistido a Palmeiras x Santo André — houve 31 mil espectadores.
Quem paga caro hoje em dia é quem não é sócio, acorda de manhã e decide se vai tomar um chope, ir à praia, à piscina de seu condomínio ou ao futebol. No passado, todos os clubes deixavam a bilheteria aberta à espera de que as pessoas preferissem ver seu time de coração. É uma lenda que o cimento estava lotado. Ou a melhor média de espectadores no Brasil não seria de 22 mil, em 1983. Na Alemanha, hoje, é de 44 mil.
Corinthians, Palmeiras e, em parte, o São Paulo, com seus planos de fidelidade, dão preferência ao cliente. Nos últimos quatro anos, aumentaram sua carteira de fidelidade. Isso se junta ao argumento que sempre valeu, o de que time leva torcida quando vai bem e não leva quando está mal. Não pode ser só assim.
Também não dá mais para repetir exaustivamente que os dirigentes brasileiros criaram um plano de elitização. Dizemos há décadas que a cartolagem brasileira é incompetente. A pergunta é se ela só foi competente para inventar um maquiavélico projeto elitista.
A verdade é que por décadas — e ainda hoje — não houve nem ricos, nem médios nem pobres nos estádios. É isso que precisa mudar.
O Brasil tem potencial para levar mais gente aos jogos, o que significará pulsar o futebol como indústria. Quanto mais gente interessada, mais arquibancadas cheias, mais impostos pagos, mais empregos gerados.
A presença aumentou 10% nos últimos anos e crescer mais 10% levará a um patamar ainda ridículo de 20 mil por partida. Dá para melhorar muito. O primeiro passo é parar de perguntar por que a torcida não vai e começar a contar a ela que razões tem para ir.
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